7 de abr. de 2015

O dia em que eu morei em São Paulo

Sampa, minha casa por 1 dia.
Eu poderia me candidatar a entrar pro Livro dos Recordes por causa dessa história que vou lhes contar:

O ano era 2005, eu vivia no Rio de Janeiro, dividindo um apartamento bem legal com uma amiga em Copacabana. Após 3 meses de trabalho como gerente administrativa de uma empresa, o dono da empresa me deu a aterradora notícia de que devido a uma reestruturação o meu cargo seria extinto, ou seja, eu ficaria sem emprego e não tinha direito a auxílio desemprego por causa do pouco tempo de serviço.

Mais uma vez, a montanha-russa da minha vida fez um "looping" e lá estava o mundo todo de cabeça para baixo! Avisei a todos os meus amigos que estava procurando emprego e comecei a mandar currículo a torto e a direito, até que 3 meses depois de "Lamentamos informar que..." um grande amigo que morava em São Paulo me disse: "Sampa tem o mercado bem mais aquecido que o Rio. Pega seu CV, suas roupas e o que for essencial e vem passar um tempo aqui na minha casa. Moro sozinho num apartamento de 3 quartos, você fica comigo o tempo que precisar e vamos disseminar o seu CV por aqui, você vai encontrar algo rápido". 

Diante de um convite desse e já sem saber como faria para pagar o próximo mês de aluguel, eu conversei com meus pais, que como sempre, me apoiaram, informei à moça com quem dividia o apartamento que iria sair no final do mês e, depois de 3 festas de despedida e muitas lágrimas derramadas, minha irmã e meu grande amigo Xande* foram me levar na rodoviária do Rio de Janeiro para a minha viagem em busca de um lugar ao sol em Sampa.

Seis horas depois, por volta das 18:00 de um domingo de março, eu desembarcava na enorme rodoviária de São Paulo, cheia de caixas, porque eu não tinha malas suficientes para levar "o essencial". Naquela época, eu não conhecia o meu marido e ainda não tinha aprendido a ser compacta nas viagens. Meu amigo anfitrião foi me buscar e quando me viu, deu uma gargalhada e disse: "Você tá parecendo a Senhora do Destino com todas essas caixas!", fazendo uma alusão à retirante da novela que estava no ar naquela época. Ao chegarmos na casa dele, conheci o seu namorado, que era dono de uma badalada casa noturna de Sampa. Ao ver o meu CV, ele disse que poderia ter uma vaga para mim no escritório da empresa dele, que era para eu entrar em contato com a gerente administrativa dele no dia seguinte. Fui dormir radiante e cheia de expectativas! 

Na manhã seguinte, minha prima Maíla foi me ajudar a desencaixotar as minhas coisas e nunca esqueço dos olhinhos dela brilhando de felicidade quando ela me disse: "Ai, Lara, nem acredito que você vai morar aqui!" Depois de esvaziarmos todas as caixas, ela foi me levar para comprar uma linha de celular de São Paulo, mas antes disso, resolvemos parar para almoçar. Eu estava com a bandeja do self-service na mão quando o celular da Maíla tocou. Ela me passou o telefone com uma carinha murcha: "É o Xande, parece que você arranjou um emprego no Rio". Eu atendi o telefone e o Xande exultante foi logo dizendo (sem nem dizer "alô", como é característico dele): "Você tem que ligar pra Herbert Richers AGORA! Surgiu uma vaga lá e eles estão te caçando! Você tem que voltar pro Rio HOJE!" Eu olhei pra Maíla com o prato na mão e disse: "Prima, uma empresa pra qual eu tinha enviado CV em fevereiro tá me procurando pra preencher uma vaga com urgência". Vamos acabar de comer e voltar pra casa porque eu tenho que ligar pra eles. 

Liguei para a empresa e o diretor que me atendeu disse que havia surgido uma vaga de assistente administrativa bilíngue de última hora e que ele estava ciente de que eu tinha acabado de chegar em São Paulo (porque tínhamos um amigo em comum com quem ele havia entrado em contato procurando por mim), e terminou o telefonema dizendo: "Se você voltar pro Rio, não vai passar por processo seletivo, a vaga é sua." Eu, ainda trêmula, liguei pros meus pais, que nessa época moravam em Fortaleza. Meu pai sempre foi meu conselheiro em assuntos de trabalho e eu só conseguia tomar uma decisão de consciência tranquila depois de ouvir a opinião dele, ele sempre me passava aquela gota de convicção que me faltava: "Minha filha, apesar do salário não ser lá essas coisas, é algo seguro. Você tem perspectivas em São Paulo, mas não tem nada garantido. Aceite esse emprego, volte pro Rio e se reestruture, se não for o que você esperava, volte a procurar algo melhor, mas com calma e tendo um salário fixo pra pagar as suas contas e, além disso, no Rio você tem a sua irmã. Peque o primeiro ônibus que puder e volte."

Assim eu fiz. Já não tinha mais as caixas que havíamos jogado fora, então meu amigo me emprestou as malas dele, me levou voado para a rodoviária e às 17:00 de segunda-feira eu estava no ônibus para outras 6 horas de viagem até o Rio de Janeiro. Minha irmã foi me buscar na rodoviária do Rio naquela noite quase sem acreditar no que estava acontecendo e, como tinha sido tudo tão rápido, obviamente não deu tempo de avisar pra ninguém que eu estava voltando. Imaginem a cara de susto dos amigos que tinham ido às minhas festas de despedida quando davam de cara comigo na rua. Cheguei a ouvir de um deles a piadinha "poxa, se era pra saber o quanto a gente te ama, não precisava inventar que ia embora pra ver a gente chorando, bastava perguntar". 

No final das contas, passei mais tempo dentro do ônibus do que em Sampa propriamente e com essa experiência aprendi que, muitas vezes, a energia ao nosso redor está estancada e nada acontece, basta uma mudança de atitude ou, no meu caso, de cidade, para que a energia volte a fluir de forma favorável. A outra lição que tirei disso tudo, que não é novidade para mim tendo em vista que meus pais sempre me disseram isso, e nem pra ninguém, porque é uma conclusão bastante clichê, é que o maior tesouro que podemos ter são verdadeiros amigos. Porém, o que muitas vezes não enxergamos, é que um verdadeiro amigo não precisa estar ao seu lado o tempo todo em todas as fases da sua vida, basta estar lá na hora certa! 

Não citei o nome do grande amigo que se ofereceu para me acolher em São Paulo porque perdemos o contato há algum tempo e, sendo ele um cara super discreto, daqueles que nem página em redes sociais tem, não achei correto citar o nome dele sem antes consultá-lo, mas se um dia esse texto cair nas mãos dele, ele sabe quem é e sabe que nunca sairá das minhas lembranças, do meu coração e terá para sempre a minha gratidão. Em tempos de Facebook, em que uma amizade facilmente se desfaz por causa da falta de um "Like", achei relevante registrar esse episódio nas minhas histórias, pois eu mudo de cidade, de país, de continente, perco o contato com as pessoas, mas não perco as pessoas nem as substituo pelas novas que vou conquistando pelo caminho, apenas abro espaço no meu mundo que não tem fronteiras, mas cabe no meu coração.

*Xande é o meu grande amigo Alexandre Goldsmid, que me fez lembrar dessa divertida passagem da minha vida quando escreveu um "comentário-livro" na primeira postagem que publiquei aqui no blog: Começar de novo...

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